quarta-feira, 11 de maio de 2011

Pulcrícomo - vela nele!

Pulcrícomo é um cara que tem uma formosa cabeleira.

Você já ouviu alguém xingar chamar alguém de pulcrícomo? Não? Nem eu.

Acho que o idioma deveria dar o exemplo e começar a se livrar dos termos que não servem para nada. Poderíamos começar a "emagrecer" nossa vida livrando-a de toda sorte de pesos inúteis. Minha sugestão aqui é que comecemos pelo dicionário.

Nada como um dicionário fininho, esguio e elegante, com o corpitcho dobrável como o de um atleta.  Sumam com aqueles dicionários que mais parecem um frigobar. São morada de traças e ainda por cima a capa descola das páginas quando são muito folheados.

Claro que existem os modelos enxutos, mas são considerados incompletos. Porque não considerar inexistente, daqui por diante, todas as palavras que não constem nos dicionários resumidos? Para mim os "incompletos" são os mais completos. Os outros são apenas gordos.

A vida começaria a se tornar bem mais simples a partir daí. Essa mentalidade prática e desapegada atingiria muitos outros assuntos. Claro! Porque assim como uma mente enrolada enrola tudo, uma mente "cleam" descomplica tudo o que for atingido pela luz da sua reflexão.

Todos nós seríamos mais felizes com um dicionário mais fino, pois ele seria a promessa silenciosa de descomplicações futuras. Defendo essa tese.

Há palavras que, se um dia foram utilizadas, esse dia se perde na poeira de um passado remotissimo. Essas palavras estão lá, enfileiradas e caquéticas fazendo número e gastando nosso oxigênio. Pra quê? Vejo-as ansiosas, mãos tremendo, doidinhas para serem acionadas. Estão crentes que ainda servem para alguma coisa. Acabemos com o sofrimento delas!  Minha clarividência enxerga essas velhas ossudas e ressecadas escovando os dentes todos as manhãs e penteando seus ralos cabelos em movimentos lentos e exasperantes. Tudo debalde. Elas acham que têm algum direito à vida só porque obedecem à ordem alfabética. Coitadas. Mal sabem que um simples "enter" numa caixa de pesquisa é suficiente para encontrar qualquer coisa perdida no planeta.  A esperança delas me incomoda porque é vã. Jamais voltarão a ser acionadas nem por um pobre poeta carente de rimas.

Sustento que deveria haver funerais para as palavras. Acho que é uma maneira digna de nos livrarmos delas. Penso em uma cerimônia simples, talvez na Academia Brasileira de Letras. Eles não se negariam a isso, pois cada integrante construiu sua glória pessoal justamente em cima das palavras, então têm mais é obrigação de fazerem uma bela despedida.

Os homens usariam terno e gravata. As mulheres, qualquer coisa que combinasse com isso. Tudo não levaria mais que trinta ou quarenta minutos. As honras e despedidas seriam dadas a todas as palavras palavras aposentadas (esquecidas, ou impraticáveis, ou envelhecidas, ou inúteis, ou ... chamem como quiserem).  Os imortais, em nosso nome, se despediriam dessas palavras mortas para sempre. Não sem louvar-lhes o poder expressivo ou sonoridade agradável. Não sem lamentarem seu desuso, chamando a atual sociedade de simplista e sem afeição pela cultura e a beleza. Não sem se mostrarem pasmos com as mentes ralas da atualidade.

Poderia ser feita com antecedência uma pesquisa para confirmar se de fato elas eram mesmo palavras perdidas e deixadas de lado.

Quem sabe um singelo poema poderia ser composto utilizando-se essas palavras pela última vez?  Seria o momento tocante da cerimônia. O celebrante pronunciaria cada uma delas pela derradeira vez, pausadamente. Enquando isso fosse feito, uma vela seria apagada. Uma vela para cada palavra falecida. Mais um breve agradecimento pelos serviços prestados ao idioma... e adeus.

Depois disso as falecidas seriam excluídas das próximas edições dos dicionários da língua portuguesa. Qualquer gaiato que resolvesse utilizá-las dali por diante perderia ponto em sua redação (por exemplo) por estar utilizando um termo inexistente que nem para neologismo serve.

Sim, isso é mais que necessário. Quem me conhece sabe que tenho o cacoete emocional de atribuir personalidade aos seres inanimados. Não estou de todo convencida de que nossos irmãos inanimados não tenham sentimento nenhum.  Também não sei se palavras podem ser chamadas de seres, mas pouco importa. Elas ganham volume e formato em nossas bocas e livros, então têm qualquer coisa de "corpo-existente". Se ninguém se convencer de que as palavras são seres, a cerimônia será realizada assim mesmo, mas em respeito aos sentimentos das pessoas "tipo eu".

Coquetel ao final da cerimônia? Acho que sim. Os imortais vão considerar interessante contar com essa movimentação em suas agendas.

E tem mais: poderíamos estender essa "limpeza de armário" à todos os setores da nossa vida. Do armário propriamente dito a tudo o mais. Por exemplo:

1- "Ficante" que você não vai usar mais - vela nele. Pra quê guardar telefone?
2- Pessoas que não foram legais, sumiram do mapa e você nem sabe se ainda estão vivas. Vela nelas!
3- Sonhos sem cabimento - vela também!
4- Más poesias cometidas no passado - idem.
5- Mágoa e traumas já comentados, trabalhados, analisados e chorados. Chegaaaaa!

E por aí vai.

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quarta-feira, 11 de maio de 2011

Pulcrícomo - vela nele!

Pulcrícomo é um cara que tem uma formosa cabeleira.

Você já ouviu alguém xingar chamar alguém de pulcrícomo? Não? Nem eu.

Acho que o idioma deveria dar o exemplo e começar a se livrar dos termos que não servem para nada. Poderíamos começar a "emagrecer" nossa vida livrando-a de toda sorte de pesos inúteis. Minha sugestão aqui é que comecemos pelo dicionário.

Nada como um dicionário fininho, esguio e elegante, com o corpitcho dobrável como o de um atleta.  Sumam com aqueles dicionários que mais parecem um frigobar. São morada de traças e ainda por cima a capa descola das páginas quando são muito folheados.

Claro que existem os modelos enxutos, mas são considerados incompletos. Porque não considerar inexistente, daqui por diante, todas as palavras que não constem nos dicionários resumidos? Para mim os "incompletos" são os mais completos. Os outros são apenas gordos.

A vida começaria a se tornar bem mais simples a partir daí. Essa mentalidade prática e desapegada atingiria muitos outros assuntos. Claro! Porque assim como uma mente enrolada enrola tudo, uma mente "cleam" descomplica tudo o que for atingido pela luz da sua reflexão.

Todos nós seríamos mais felizes com um dicionário mais fino, pois ele seria a promessa silenciosa de descomplicações futuras. Defendo essa tese.

Há palavras que, se um dia foram utilizadas, esse dia se perde na poeira de um passado remotissimo. Essas palavras estão lá, enfileiradas e caquéticas fazendo número e gastando nosso oxigênio. Pra quê? Vejo-as ansiosas, mãos tremendo, doidinhas para serem acionadas. Estão crentes que ainda servem para alguma coisa. Acabemos com o sofrimento delas!  Minha clarividência enxerga essas velhas ossudas e ressecadas escovando os dentes todos as manhãs e penteando seus ralos cabelos em movimentos lentos e exasperantes. Tudo debalde. Elas acham que têm algum direito à vida só porque obedecem à ordem alfabética. Coitadas. Mal sabem que um simples "enter" numa caixa de pesquisa é suficiente para encontrar qualquer coisa perdida no planeta.  A esperança delas me incomoda porque é vã. Jamais voltarão a ser acionadas nem por um pobre poeta carente de rimas.

Sustento que deveria haver funerais para as palavras. Acho que é uma maneira digna de nos livrarmos delas. Penso em uma cerimônia simples, talvez na Academia Brasileira de Letras. Eles não se negariam a isso, pois cada integrante construiu sua glória pessoal justamente em cima das palavras, então têm mais é obrigação de fazerem uma bela despedida.

Os homens usariam terno e gravata. As mulheres, qualquer coisa que combinasse com isso. Tudo não levaria mais que trinta ou quarenta minutos. As honras e despedidas seriam dadas a todas as palavras palavras aposentadas (esquecidas, ou impraticáveis, ou envelhecidas, ou inúteis, ou ... chamem como quiserem).  Os imortais, em nosso nome, se despediriam dessas palavras mortas para sempre. Não sem louvar-lhes o poder expressivo ou sonoridade agradável. Não sem lamentarem seu desuso, chamando a atual sociedade de simplista e sem afeição pela cultura e a beleza. Não sem se mostrarem pasmos com as mentes ralas da atualidade.

Poderia ser feita com antecedência uma pesquisa para confirmar se de fato elas eram mesmo palavras perdidas e deixadas de lado.

Quem sabe um singelo poema poderia ser composto utilizando-se essas palavras pela última vez?  Seria o momento tocante da cerimônia. O celebrante pronunciaria cada uma delas pela derradeira vez, pausadamente. Enquando isso fosse feito, uma vela seria apagada. Uma vela para cada palavra falecida. Mais um breve agradecimento pelos serviços prestados ao idioma... e adeus.

Depois disso as falecidas seriam excluídas das próximas edições dos dicionários da língua portuguesa. Qualquer gaiato que resolvesse utilizá-las dali por diante perderia ponto em sua redação (por exemplo) por estar utilizando um termo inexistente que nem para neologismo serve.

Sim, isso é mais que necessário. Quem me conhece sabe que tenho o cacoete emocional de atribuir personalidade aos seres inanimados. Não estou de todo convencida de que nossos irmãos inanimados não tenham sentimento nenhum.  Também não sei se palavras podem ser chamadas de seres, mas pouco importa. Elas ganham volume e formato em nossas bocas e livros, então têm qualquer coisa de "corpo-existente". Se ninguém se convencer de que as palavras são seres, a cerimônia será realizada assim mesmo, mas em respeito aos sentimentos das pessoas "tipo eu".

Coquetel ao final da cerimônia? Acho que sim. Os imortais vão considerar interessante contar com essa movimentação em suas agendas.

E tem mais: poderíamos estender essa "limpeza de armário" à todos os setores da nossa vida. Do armário propriamente dito a tudo o mais. Por exemplo:

1- "Ficante" que você não vai usar mais - vela nele. Pra quê guardar telefone?
2- Pessoas que não foram legais, sumiram do mapa e você nem sabe se ainda estão vivas. Vela nelas!
3- Sonhos sem cabimento - vela também!
4- Más poesias cometidas no passado - idem.
5- Mágoa e traumas já comentados, trabalhados, analisados e chorados. Chegaaaaa!

E por aí vai.

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