segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O cãozinho Azul

Uma historinha pra contar para a Clarinha quando ela crescer.

O cãozinho azul nasceu branquinho branquinho, como qualquer coisa branquinha-branquinha que você conheça. Recém-nascido, em meio aos olhares sádicos das crianças, forraram sua "manjedoura" com trapinhos e pedaços de papel crepon azul, já que era um menininho. Também para dar um ar mais festivo à ocasião.

Às crianças foi ordenado que não o tocassem e que se o ímpeto fosse por demais intenso, pelo menos canalizassem sua maldade original para a Barbie velha que a maninha não queria mais. Como sabemos, Barbies velhas deixam de ser frescas e topam qualquer parada.

O cãozinho branco, mole e úmido como uma meleca, logo aprendeu a revolver-se na "manjedoura". De tanto fazê-lo o azul do papel crepon mudou-se para os seus pêlos, o que foi anunciado como misteriosa mutação. Só que a mutação não passou incólume pelo scanner da dona Maroca, babá severa e experiente, que desfez a aura de mistério esfregando na cara dos pasmos espectadores  os restos do crepon totalmente desmilinguido.

Ao contrário do que era de se esperar, com o passar dos dias a cor não se desfez, pelo contrário: atracou-se ao cãozinho indefeso como teimosa entidade, uma espécie de encosto que resolveu habitar aquele corpinho, só que pelo lado de fora. Ninguém se animou a exorcizá-la, então ficou.

Nenhum outro nome seria mais acertado - resolveram - do que simplesmente "Azul". Assim veio ao mundo, para deslumbramento da família Lima, o cãozinho Azul.

Foi essa a história que lhe contaram e recontaram dezenas de vezes ao longo de sua vidinha. Era curioso quanto às suas origens, como toda criança adotada. Não falaram em pai nem em mãe pois, espertamente talvez, quando chegavam no ponto em que contavam como ele se tornara azul, sua curiosidade por outros detalhes se esvaía completamente. Então ele se deslumbrava com sua peculiaridade como sendo um indicador de nobreza.

Milagre ou falta de banho? Ninguém sabe ao certo. O mistério permaneceu e todas as vezes que ele refazia a pergunta a história era recontada com uma pontinha a mais aqui e ali, de forma a ser sempre nova. Assim, o "detalhe" pai e mãe ia ficando pra depois. Se ele continuasse perguntando, decerto acrescentariam que ele caira do céu.

Ninguém quer ver um cãozinho infeliz. E que mal há, me digam, em fazê-lo acreditar que era diferente e especial? Afinal não era mesmo verdade?

"Que lindo cãozinho sou eu! Relíquia da família Lima! Invejado por todos e muito simpático. Totalmente azul como ninguém mais no mundo. Talvez algum marciano... mas aqui na Terra não tem pra ninguém. Vou ter 20 filhotes, com todas as cores do arco-íris acrescentadas de suas nuances, para não repetir." E assim passavam-se os sóis e as luas.

Se formos ser bem sinceros, Azul não possuía dons especiais: não sabia imitar gato, não se fingia de morto, não "quase falava" nem pulava argolas incandescentes. Era um cão, digamos, basicão - sem trocadinho. Mas também não era cobrado nesse sentido. Ao observar os dons de seus amigos ele concluía com seus botões:  "E  quem precisa aprender truques se tem os pêlos azuis?  Isso deve bastar!" - pensava ele. E pensava bem, porque bastava.

Sua vida transcorria simples e divertida, sem novidades ou emoções aflitivas. Daí, talvez, sua saúde e bom humor. Porque se não sabia fazer truques, pelo menos sabia sorrir, e sorria! Para os transeuntes, para os vizinhos, para as crianças quando acordavam, para todos.

Certa vez, passeando com seu dono, Azul notou que outros cães eram igualmente afortunados. Recebiam carinho e atenção, passeavam regularmente, comiam bem todos os dias e ganhavam cafunés.  Pior do que isso: ele mesmo não chamava a atenção dos outros cães. Eles o cumprimentavam com educação: Bom dia! Boa tarde! Boa noite! - mas não lhe direcionavam nenhum olhar especialmente curioso. Mas como? Ele era ímpar!

Certa vez uma cadelinha lhe lançou olhares insistentes que o fizeram colocar-se estrategicamente sob o sol para realçar a cor e ganhar um brilho extra. Fez todas as poses mas notou, meio encucado, que não era para seus lindos pêlos que ela estava olhando. Era uma paquera comum entre cães comuns e isso começou a lhe preocupar. Ele sabia que não existia no mundo outro cão como ele, afortunadamente, explendidamente, curiosamente e indiscutivelmente azul. Mas ela lhe olhou como olhou para o Desmóscrates, cão da casa ao lado. O mesmo olhar da semana passada.

Crise existencial. Adolescência, talvez? Não sei. Não sei a idade de Azul. Só sei que ele chegou a perder o sono.

Mais um dia pela frente... Com fundas olheiras saiu com seu dono para um passeio. Linda manhã... que poderia ter demorado mais a raiar... Sono atrasado.

Pois sim: naquela manhã "especialmente comum" seu dono deparou-se com um amigo que não via há tempos. Foi uma surpresa mútua com abraços, vários tapas nas costas (por quê os humanos fazem isso, meu Deus?!)  e flashes de recordações de lá e de cá. Ele observava aquela alegre esquisicite e considerava, meio amargurado, o fato de que não possuía lembranças assim. Pelo menos nenhuma que valesse tantos tapas.

Por fim, esvaindo-se os assuntos, seu dono lembrou-se de exibi-lo, sorridente, ao amigo. O amigo, em um gesto previsível e polido, fez-lhe um cafuné e lhe sorriu com um olhar como o de quem acaba de ver algo indiscutivelmente... razoável.

Razoável?  Ele não era um cão "razoável" mas o explêndido e raro cão azul, único na cidade e quem sabe no mundo!

Pelo jeito o tal amigo não vira nada de esplêndido nele, pois lançara-lhe um olhar nada mais do que morno. Um cafuné, um sorriso comum e um olhar morno para um cão razoável. Ele não merecia uma desfeita dessa...

Resolveu colocar tudo em pratos limpos. Ao chegar em casa seus latidos eram de quem exige uma explicação. Algo estava errado e agora era hora de descobrir.

Confronto!  A família viu-se em polvorosa tentando acalmá-lo. Ele andava em círculos pelo tapete falando, digo, latindo coisas desconexas sem parar, cabeça baixa, emendando uma frase (frase? ) na outra. A princípio pensavam que ele queria saber quem eram seus pais. Depois notaram que não era esse o "xis" da questão: ele queria saber o que havia de errado consigo, que sempre foi tratado em casa como raridade mas, no mundo, não passava de um Zé Ruela.

Disfarçadamente todos correram a esconder os espelhos da casa. Cada um foi para um lado. Seu dono fazia pose em frente ao maior espelho da casa. A porta do quanto, com outro espelho enorme, foi estrategicamente trancada enquanto discutiam. Havia algo estranho ali.

Pediu explicações, implorou, jogou-se no chão com as patas pra cima, fez que ia ter um derrame, cambaleou, soluçou de frente para a parede, tentou o suicídio prendendo a respiração, fez de tudo. Cada parte do teatro era dramatizado em um canto da sala. A última "montagem" foi justamente a que carregava uma maior força dramática: era a hora da revelação. Seu último arroubo foi em frente à cristaleira (quem ninguém lembrou de esconder) cara a cara consigo mesmo. Sim, no espelho da cristaleira.

Até então ele só reparara nas prateleiras da cristaleira e isso quando o sol incidia sobre as taças límpidas e os pequenos mimos lapidados. Aquele brilho, a luz decomposta... Era só o que olhava até então, mas dessa vez foi diferente - oh Céus!  E o quê ele viu?

Viu um cachorrinho baixinho, poucos pêlos, olhos arregalados, orelhas caídas, rabinho pouco sedutor (fino e curto)... Comum. Dolorosamente comum. E com dentes amarelados. E de óculos. De óculos? Nenhum de seus companheiros usava tal artefato. Um cão de óculos. Patético.

Pelo menos era azul. Pelo menos isto restou - pensou ele. Então resolveu tirar os óculos - azuis - para checar a cor dos olhos. Vaidade... Maldita vaidade!

O fato é que ele ficou sem saber a cor de seus olhos porque tudo o que pôde enxergar no  espelho da malfadada cristaleira era um cão baixinho de poucos pêlos, olhos arregalados, orelhas caídas, cauda mínima, dentes amarelados, sem óculos e... ENCARDIDO.

Oh dor! Oh desilusão! Então ele não era azul? Era branco, e o pior dos brancos. Não o branco neve. Não o branco marfim, não o branco azulado, mas o branco encardido.

Ali ficou, pasmo e duro como um monumento, em estado de choque. As patinhas duras esticadas para cima. Ridículo. Naquele estado mais parecia uma barata morta.

Pegaram-no e o colocaram em seu leito, em meio a muita discussão, troca de acusações e críticas mútuas: "Não se deve esconder assim as coisas de um bichinho! A culpa é sua! A verdade viria a tona mais cedo ou mais tarde! Como não pensamos nisso? Agora é tarde. Eu bem disse que não deveriam ter dado banho nele! A culpa é sua, com suas histórias rocambolescas! Chamem um médico!"

Emagreceu. Não quis falar latir pra ninguém. Chorou. Teve crise nervosa quando tentavam lhe inculcar que ele era muito especial e raro, ainda que não azul, ainda que lindamente encardidinho. Nada. Recusou até osso de rabada. Por fim, morreu.

Com uma semana, não suportando a "dor" da perda, seus donos compraram outro cão. Um pouco mais alto, um pouco mais alvo, um pouco mais peludo, que sabia se fingir de morto e - para piorar - que se olhava no espelho e sabia muito bem quem ele era.

Chato, né?

Consolo: o Céu é azul.

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segunda-feira, 20 de setembro de 2010

O cãozinho Azul

Uma historinha pra contar para a Clarinha quando ela crescer.

O cãozinho azul nasceu branquinho branquinho, como qualquer coisa branquinha-branquinha que você conheça. Recém-nascido, em meio aos olhares sádicos das crianças, forraram sua "manjedoura" com trapinhos e pedaços de papel crepon azul, já que era um menininho. Também para dar um ar mais festivo à ocasião.

Às crianças foi ordenado que não o tocassem e que se o ímpeto fosse por demais intenso, pelo menos canalizassem sua maldade original para a Barbie velha que a maninha não queria mais. Como sabemos, Barbies velhas deixam de ser frescas e topam qualquer parada.

O cãozinho branco, mole e úmido como uma meleca, logo aprendeu a revolver-se na "manjedoura". De tanto fazê-lo o azul do papel crepon mudou-se para os seus pêlos, o que foi anunciado como misteriosa mutação. Só que a mutação não passou incólume pelo scanner da dona Maroca, babá severa e experiente, que desfez a aura de mistério esfregando na cara dos pasmos espectadores  os restos do crepon totalmente desmilinguido.

Ao contrário do que era de se esperar, com o passar dos dias a cor não se desfez, pelo contrário: atracou-se ao cãozinho indefeso como teimosa entidade, uma espécie de encosto que resolveu habitar aquele corpinho, só que pelo lado de fora. Ninguém se animou a exorcizá-la, então ficou.

Nenhum outro nome seria mais acertado - resolveram - do que simplesmente "Azul". Assim veio ao mundo, para deslumbramento da família Lima, o cãozinho Azul.

Foi essa a história que lhe contaram e recontaram dezenas de vezes ao longo de sua vidinha. Era curioso quanto às suas origens, como toda criança adotada. Não falaram em pai nem em mãe pois, espertamente talvez, quando chegavam no ponto em que contavam como ele se tornara azul, sua curiosidade por outros detalhes se esvaía completamente. Então ele se deslumbrava com sua peculiaridade como sendo um indicador de nobreza.

Milagre ou falta de banho? Ninguém sabe ao certo. O mistério permaneceu e todas as vezes que ele refazia a pergunta a história era recontada com uma pontinha a mais aqui e ali, de forma a ser sempre nova. Assim, o "detalhe" pai e mãe ia ficando pra depois. Se ele continuasse perguntando, decerto acrescentariam que ele caira do céu.

Ninguém quer ver um cãozinho infeliz. E que mal há, me digam, em fazê-lo acreditar que era diferente e especial? Afinal não era mesmo verdade?

"Que lindo cãozinho sou eu! Relíquia da família Lima! Invejado por todos e muito simpático. Totalmente azul como ninguém mais no mundo. Talvez algum marciano... mas aqui na Terra não tem pra ninguém. Vou ter 20 filhotes, com todas as cores do arco-íris acrescentadas de suas nuances, para não repetir." E assim passavam-se os sóis e as luas.

Se formos ser bem sinceros, Azul não possuía dons especiais: não sabia imitar gato, não se fingia de morto, não "quase falava" nem pulava argolas incandescentes. Era um cão, digamos, basicão - sem trocadinho. Mas também não era cobrado nesse sentido. Ao observar os dons de seus amigos ele concluía com seus botões:  "E  quem precisa aprender truques se tem os pêlos azuis?  Isso deve bastar!" - pensava ele. E pensava bem, porque bastava.

Sua vida transcorria simples e divertida, sem novidades ou emoções aflitivas. Daí, talvez, sua saúde e bom humor. Porque se não sabia fazer truques, pelo menos sabia sorrir, e sorria! Para os transeuntes, para os vizinhos, para as crianças quando acordavam, para todos.

Certa vez, passeando com seu dono, Azul notou que outros cães eram igualmente afortunados. Recebiam carinho e atenção, passeavam regularmente, comiam bem todos os dias e ganhavam cafunés.  Pior do que isso: ele mesmo não chamava a atenção dos outros cães. Eles o cumprimentavam com educação: Bom dia! Boa tarde! Boa noite! - mas não lhe direcionavam nenhum olhar especialmente curioso. Mas como? Ele era ímpar!

Certa vez uma cadelinha lhe lançou olhares insistentes que o fizeram colocar-se estrategicamente sob o sol para realçar a cor e ganhar um brilho extra. Fez todas as poses mas notou, meio encucado, que não era para seus lindos pêlos que ela estava olhando. Era uma paquera comum entre cães comuns e isso começou a lhe preocupar. Ele sabia que não existia no mundo outro cão como ele, afortunadamente, explendidamente, curiosamente e indiscutivelmente azul. Mas ela lhe olhou como olhou para o Desmóscrates, cão da casa ao lado. O mesmo olhar da semana passada.

Crise existencial. Adolescência, talvez? Não sei. Não sei a idade de Azul. Só sei que ele chegou a perder o sono.

Mais um dia pela frente... Com fundas olheiras saiu com seu dono para um passeio. Linda manhã... que poderia ter demorado mais a raiar... Sono atrasado.

Pois sim: naquela manhã "especialmente comum" seu dono deparou-se com um amigo que não via há tempos. Foi uma surpresa mútua com abraços, vários tapas nas costas (por quê os humanos fazem isso, meu Deus?!)  e flashes de recordações de lá e de cá. Ele observava aquela alegre esquisicite e considerava, meio amargurado, o fato de que não possuía lembranças assim. Pelo menos nenhuma que valesse tantos tapas.

Por fim, esvaindo-se os assuntos, seu dono lembrou-se de exibi-lo, sorridente, ao amigo. O amigo, em um gesto previsível e polido, fez-lhe um cafuné e lhe sorriu com um olhar como o de quem acaba de ver algo indiscutivelmente... razoável.

Razoável?  Ele não era um cão "razoável" mas o explêndido e raro cão azul, único na cidade e quem sabe no mundo!

Pelo jeito o tal amigo não vira nada de esplêndido nele, pois lançara-lhe um olhar nada mais do que morno. Um cafuné, um sorriso comum e um olhar morno para um cão razoável. Ele não merecia uma desfeita dessa...

Resolveu colocar tudo em pratos limpos. Ao chegar em casa seus latidos eram de quem exige uma explicação. Algo estava errado e agora era hora de descobrir.

Confronto!  A família viu-se em polvorosa tentando acalmá-lo. Ele andava em círculos pelo tapete falando, digo, latindo coisas desconexas sem parar, cabeça baixa, emendando uma frase (frase? ) na outra. A princípio pensavam que ele queria saber quem eram seus pais. Depois notaram que não era esse o "xis" da questão: ele queria saber o que havia de errado consigo, que sempre foi tratado em casa como raridade mas, no mundo, não passava de um Zé Ruela.

Disfarçadamente todos correram a esconder os espelhos da casa. Cada um foi para um lado. Seu dono fazia pose em frente ao maior espelho da casa. A porta do quanto, com outro espelho enorme, foi estrategicamente trancada enquanto discutiam. Havia algo estranho ali.

Pediu explicações, implorou, jogou-se no chão com as patas pra cima, fez que ia ter um derrame, cambaleou, soluçou de frente para a parede, tentou o suicídio prendendo a respiração, fez de tudo. Cada parte do teatro era dramatizado em um canto da sala. A última "montagem" foi justamente a que carregava uma maior força dramática: era a hora da revelação. Seu último arroubo foi em frente à cristaleira (quem ninguém lembrou de esconder) cara a cara consigo mesmo. Sim, no espelho da cristaleira.

Até então ele só reparara nas prateleiras da cristaleira e isso quando o sol incidia sobre as taças límpidas e os pequenos mimos lapidados. Aquele brilho, a luz decomposta... Era só o que olhava até então, mas dessa vez foi diferente - oh Céus!  E o quê ele viu?

Viu um cachorrinho baixinho, poucos pêlos, olhos arregalados, orelhas caídas, rabinho pouco sedutor (fino e curto)... Comum. Dolorosamente comum. E com dentes amarelados. E de óculos. De óculos? Nenhum de seus companheiros usava tal artefato. Um cão de óculos. Patético.

Pelo menos era azul. Pelo menos isto restou - pensou ele. Então resolveu tirar os óculos - azuis - para checar a cor dos olhos. Vaidade... Maldita vaidade!

O fato é que ele ficou sem saber a cor de seus olhos porque tudo o que pôde enxergar no  espelho da malfadada cristaleira era um cão baixinho de poucos pêlos, olhos arregalados, orelhas caídas, cauda mínima, dentes amarelados, sem óculos e... ENCARDIDO.

Oh dor! Oh desilusão! Então ele não era azul? Era branco, e o pior dos brancos. Não o branco neve. Não o branco marfim, não o branco azulado, mas o branco encardido.

Ali ficou, pasmo e duro como um monumento, em estado de choque. As patinhas duras esticadas para cima. Ridículo. Naquele estado mais parecia uma barata morta.

Pegaram-no e o colocaram em seu leito, em meio a muita discussão, troca de acusações e críticas mútuas: "Não se deve esconder assim as coisas de um bichinho! A culpa é sua! A verdade viria a tona mais cedo ou mais tarde! Como não pensamos nisso? Agora é tarde. Eu bem disse que não deveriam ter dado banho nele! A culpa é sua, com suas histórias rocambolescas! Chamem um médico!"

Emagreceu. Não quis falar latir pra ninguém. Chorou. Teve crise nervosa quando tentavam lhe inculcar que ele era muito especial e raro, ainda que não azul, ainda que lindamente encardidinho. Nada. Recusou até osso de rabada. Por fim, morreu.

Com uma semana, não suportando a "dor" da perda, seus donos compraram outro cão. Um pouco mais alto, um pouco mais alvo, um pouco mais peludo, que sabia se fingir de morto e - para piorar - que se olhava no espelho e sabia muito bem quem ele era.

Chato, né?

Consolo: o Céu é azul.

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