segunda-feira, 23 de agosto de 2010

As canetinhas da nossa vida

Embora necessárias, ninguém gosta das despedidas. No entanto vivemos nos despedindo - ora veja!

Alguns não vão ao aeroporto para não precisarem chorar nem abanar lencinhos brancos. Outros, os "partintes",  frequentemente proíbem os grudentos amigos de acompanhá-los no embarque.  Debalde. Mesmo sem despedida, indiscutivelmente o "fui!" já é uma despedida.

Como não podemos evitar esses momentos, só temos duas escolhas a fazer: torná-los fuleiros ou especiais.

Não odeio os rituais das despedidas. Nesse quesito vou contra a maré. Gosto das formalidades das despedidas porque nos ajudam a ajeitar nossa percepção das coisas.

A gente tem a mania de achar que pode se consolar acreditando que a pessoa não foi, que daqui a pouco a maçaneta vai girar, que a tumba vai se abrir, ou que "ele está viajando" e tal.  Isso é doentio.  Melhor a porretada do adeus, com choro e velas.

Despedir-se formalmente é educativo. Traz a gente pela orelha para encarar a vida real. "Já era, acabou, não tem mais, morreu, cai na real, te vira!"

Sinto que algumas coisas no texto de nossas vidas precisam ser pontuadas e marcadas com canetinha highlight. A despedida é uma dessas canetinhas que não nos deixa espaço par ilusões. É a canetinha que nos ajuda a rearrumando nossos sentimentos que, como você sabe, são muito indisciplinados.

Quem se afasta aos poucos ou some de repente, merece fuzilamento.


O chato é que se até as coisas boas tem seu lado ruim, deduz-se que as coisas ruins também tenham o lado mais ruim ainda. E o lado ruim da despedida é aquela sensação dolorosa de que a gente nunca disse tudo o que gostaria de ter dito no momento fatídico.

Não importa o tempo que durou o abraço; foi pouco. Não importa dizer que ama, que dói, que não queria aquilo, que está sofrendo, que quer arrancar os cabelos, que a vida ficará vazia; você não explicou direito.

A gente sempre acha que a outra pessoa não entendeu direito o quando dói, o quanto você não queria aquilo, o quanto está sofrendo, o quanto deseja arrancar os cabelos e com que estrondo o seu mundo caiu. Não, o lado oposto é sempre muito burrinho e não entende a profundidade de nada. Ô desespero!


A morte é uma porcaria. Não importa o quanto você azucrinou o moribundo, fica sempre a sensação de que ele não entendeu o comprimento nem a altura nem a profundidade do seu amor. Há outras mortes (despedidas) em vida e para todas elas a síndrome é a mesma. Aí você quer voltar atrás só para dizer tudo de novo, só que com mais entonação. Para chorar de novo, só que com mais soluços. A vontade é de sofrer de forma mais convincente. Console-se em saber que não adiantará. Na hora da saudade, a síndrome do "faltou eu dizer" vai te atacar de novo.

É a sua cruz mas não fique assim não. Acontece com todo mundo. Quando chegar minha vez de partir não se preocupe: pode falar tudo uma vez só que eu vou entender.

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segunda-feira, 23 de agosto de 2010

As canetinhas da nossa vida

Embora necessárias, ninguém gosta das despedidas. No entanto vivemos nos despedindo - ora veja!

Alguns não vão ao aeroporto para não precisarem chorar nem abanar lencinhos brancos. Outros, os "partintes",  frequentemente proíbem os grudentos amigos de acompanhá-los no embarque.  Debalde. Mesmo sem despedida, indiscutivelmente o "fui!" já é uma despedida.

Como não podemos evitar esses momentos, só temos duas escolhas a fazer: torná-los fuleiros ou especiais.

Não odeio os rituais das despedidas. Nesse quesito vou contra a maré. Gosto das formalidades das despedidas porque nos ajudam a ajeitar nossa percepção das coisas.

A gente tem a mania de achar que pode se consolar acreditando que a pessoa não foi, que daqui a pouco a maçaneta vai girar, que a tumba vai se abrir, ou que "ele está viajando" e tal.  Isso é doentio.  Melhor a porretada do adeus, com choro e velas.

Despedir-se formalmente é educativo. Traz a gente pela orelha para encarar a vida real. "Já era, acabou, não tem mais, morreu, cai na real, te vira!"

Sinto que algumas coisas no texto de nossas vidas precisam ser pontuadas e marcadas com canetinha highlight. A despedida é uma dessas canetinhas que não nos deixa espaço par ilusões. É a canetinha que nos ajuda a rearrumando nossos sentimentos que, como você sabe, são muito indisciplinados.

Quem se afasta aos poucos ou some de repente, merece fuzilamento.


O chato é que se até as coisas boas tem seu lado ruim, deduz-se que as coisas ruins também tenham o lado mais ruim ainda. E o lado ruim da despedida é aquela sensação dolorosa de que a gente nunca disse tudo o que gostaria de ter dito no momento fatídico.

Não importa o tempo que durou o abraço; foi pouco. Não importa dizer que ama, que dói, que não queria aquilo, que está sofrendo, que quer arrancar os cabelos, que a vida ficará vazia; você não explicou direito.

A gente sempre acha que a outra pessoa não entendeu direito o quando dói, o quanto você não queria aquilo, o quanto está sofrendo, o quanto deseja arrancar os cabelos e com que estrondo o seu mundo caiu. Não, o lado oposto é sempre muito burrinho e não entende a profundidade de nada. Ô desespero!


A morte é uma porcaria. Não importa o quanto você azucrinou o moribundo, fica sempre a sensação de que ele não entendeu o comprimento nem a altura nem a profundidade do seu amor. Há outras mortes (despedidas) em vida e para todas elas a síndrome é a mesma. Aí você quer voltar atrás só para dizer tudo de novo, só que com mais entonação. Para chorar de novo, só que com mais soluços. A vontade é de sofrer de forma mais convincente. Console-se em saber que não adiantará. Na hora da saudade, a síndrome do "faltou eu dizer" vai te atacar de novo.

É a sua cruz mas não fique assim não. Acontece com todo mundo. Quando chegar minha vez de partir não se preocupe: pode falar tudo uma vez só que eu vou entender.

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