sexta-feira, 12 de março de 2010

Cópias velhas

Há quem pense que viver cada dia como se fosse o último é ser irresponsável e inconsequente. Não. Não é meter o pé na jaca, querer tudo de uma vez, desesperar e se encher de dívidas.   Viver cada dia como se fosse o último é:

1-  Prestar muita atenção ao seu redor. Ame os minutos, colha-os com os olhos. Mire as pessoas e repare em tudo o que elas tem de lindo. Relacione-se. Descubra a alma de quem está perto, mostre-se, preste atenção!  Que nada escape à sua sensibilidade. Isso é degustar o momento. Prestar muita atenção a ele é "fotografar com o coração".

2- Tire muitas fotos. Não as poupe. Registre até bocejo e coceira no pé. Em sua mente não cabe tudo, então guarde os risos, o salto quebrado, a gola virada, o suor escorrendo, os abraços, gargalhadas, a troca de olhares. Tranforme o efêmero em "eterno"  com sua máquina fotográfica mágica.

3-   Quando o momento passar, estique-o através de relembranças. Vá dormir remastigando a sua alegria, sua felicidade, as pessoas que ama. Deixe-as repetir em sua mente as mesmíssimas piadas. Elas estão loucas para contar de novo, acredite. Permita que seus risos voltem a ecoar pela sala da sua cabeça.  Elas querem reviver! Esse é o sonho de cada defunto. Sim, aquele pessoal da foto não existe mais. O que existem são réplicas mais velhas.  À noite, na cama, é o melhor lugar para você sublinhar o que se passou.

Eu me odiaria pra sempre se não tivesse fotografado esse momento aí de cima. Não se repetirá. Pensar nisso seria quase desesperador se não fosse a esperança de que outras coisas boas também continuarão a acontecer. Claro que acontecerão! Se você souber com certeza que nada de legal voltará a contecer pra mim, pode me dar um tiro.  Hehehe - brincadeirinha! Largue essa arma! Não confio em seu julgamente.

Pois é: ainda que façamos outra festa semelhante, é absolutamente improvavel que as mesmas pessoas compareçam. Não, não comparecerão. Em primeiro lugar porque é como eu já disse: todos esses daí já não são mais. Ficaram mais velhos e tudo o que temos hoje é uma cópia razoável do que já foram. Tem gente até que já mudou o penteado! Uns emagreceram, outros engordaram...   Mesmo que eles não fossem apenas réplicas gastas de si mesmos eu garanto: juntar essa galera de novo não é impossível mas é complicado.

Não dói pensar nisso? Dói sim.  Mas ha, não quero esquentar a cabeça com isso hoje.

Se não quero  esquentar a cabeça com isso hoje, porque estou postando esse texto? Muito simples: porque esquentei a cabeça com isso ontem, quando redigi  esse texto. Ontem esquentei a cabeça - hoje a refresquei. O texto está no ar porque quero agora esquentar a SUA cabeça.

Calma, calma! A vida se renova. Que venha o novo dia carregando seu cesto de cores e odores. Venham novos dias! Amanhã posso estar mais magra, com a pele mais tratada, com novos amigos, com menos fraquezas, com mais leitores...   Espero pelo amanhã. Mas quero vivê-lo consciente de que nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia.

(Admito: essa frase é manjada pra caramba! Mas quebrou o maior galho como finalização de texto.)

2 comentários:

  1. Égua, isso é muito trabalhoso, diria até que completamente neurótico... prestar atenção em tudo, tentar reter cada momento!?viver a vida tem a mesma lógica de um pequeno ato dela que é dirigir um carro: a gente faz tudo que é preciso, mas não se dá conta disso, senão nnguém suportaria a pressão...

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  2. Prestar atenção, olhar bem ao redor... é coisa de quem está sempre pensando que aquilo pode não voltar mais. É um jeito de viver e olhar a vida. Não é o único jeito, talvez nem mesmo o melhor, mas é o jeito daqueles que querem olhar pra trás e dizer: foi bom, acabou mas vivi aquilo intensamente, valorizei, senti todos os gostinhos possíveis. Parece-me que essa "coisa cansativa" é o único remédio para ter saudade sem dor. Mas claro, a mioria de nós, na maioria do tempo, não fazemos isso; fazemos exatamente o que você disse: fazemos o que é preciso sem nos darmos conta de nada. Depois, passou...

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sexta-feira, 12 de março de 2010

Cópias velhas

Há quem pense que viver cada dia como se fosse o último é ser irresponsável e inconsequente. Não. Não é meter o pé na jaca, querer tudo de uma vez, desesperar e se encher de dívidas.   Viver cada dia como se fosse o último é:

1-  Prestar muita atenção ao seu redor. Ame os minutos, colha-os com os olhos. Mire as pessoas e repare em tudo o que elas tem de lindo. Relacione-se. Descubra a alma de quem está perto, mostre-se, preste atenção!  Que nada escape à sua sensibilidade. Isso é degustar o momento. Prestar muita atenção a ele é "fotografar com o coração".

2- Tire muitas fotos. Não as poupe. Registre até bocejo e coceira no pé. Em sua mente não cabe tudo, então guarde os risos, o salto quebrado, a gola virada, o suor escorrendo, os abraços, gargalhadas, a troca de olhares. Tranforme o efêmero em "eterno"  com sua máquina fotográfica mágica.

3-   Quando o momento passar, estique-o através de relembranças. Vá dormir remastigando a sua alegria, sua felicidade, as pessoas que ama. Deixe-as repetir em sua mente as mesmíssimas piadas. Elas estão loucas para contar de novo, acredite. Permita que seus risos voltem a ecoar pela sala da sua cabeça.  Elas querem reviver! Esse é o sonho de cada defunto. Sim, aquele pessoal da foto não existe mais. O que existem são réplicas mais velhas.  À noite, na cama, é o melhor lugar para você sublinhar o que se passou.

Eu me odiaria pra sempre se não tivesse fotografado esse momento aí de cima. Não se repetirá. Pensar nisso seria quase desesperador se não fosse a esperança de que outras coisas boas também continuarão a acontecer. Claro que acontecerão! Se você souber com certeza que nada de legal voltará a contecer pra mim, pode me dar um tiro.  Hehehe - brincadeirinha! Largue essa arma! Não confio em seu julgamente.

Pois é: ainda que façamos outra festa semelhante, é absolutamente improvavel que as mesmas pessoas compareçam. Não, não comparecerão. Em primeiro lugar porque é como eu já disse: todos esses daí já não são mais. Ficaram mais velhos e tudo o que temos hoje é uma cópia razoável do que já foram. Tem gente até que já mudou o penteado! Uns emagreceram, outros engordaram...   Mesmo que eles não fossem apenas réplicas gastas de si mesmos eu garanto: juntar essa galera de novo não é impossível mas é complicado.

Não dói pensar nisso? Dói sim.  Mas ha, não quero esquentar a cabeça com isso hoje.

Se não quero  esquentar a cabeça com isso hoje, porque estou postando esse texto? Muito simples: porque esquentei a cabeça com isso ontem, quando redigi  esse texto. Ontem esquentei a cabeça - hoje a refresquei. O texto está no ar porque quero agora esquentar a SUA cabeça.

Calma, calma! A vida se renova. Que venha o novo dia carregando seu cesto de cores e odores. Venham novos dias! Amanhã posso estar mais magra, com a pele mais tratada, com novos amigos, com menos fraquezas, com mais leitores...   Espero pelo amanhã. Mas quero vivê-lo consciente de que nada do que foi será de novo do jeito que já foi um dia.

(Admito: essa frase é manjada pra caramba! Mas quebrou o maior galho como finalização de texto.)

2 comentários:

  1. Égua, isso é muito trabalhoso, diria até que completamente neurótico... prestar atenção em tudo, tentar reter cada momento!?viver a vida tem a mesma lógica de um pequeno ato dela que é dirigir um carro: a gente faz tudo que é preciso, mas não se dá conta disso, senão nnguém suportaria a pressão...

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  2. Prestar atenção, olhar bem ao redor... é coisa de quem está sempre pensando que aquilo pode não voltar mais. É um jeito de viver e olhar a vida. Não é o único jeito, talvez nem mesmo o melhor, mas é o jeito daqueles que querem olhar pra trás e dizer: foi bom, acabou mas vivi aquilo intensamente, valorizei, senti todos os gostinhos possíveis. Parece-me que essa "coisa cansativa" é o único remédio para ter saudade sem dor. Mas claro, a mioria de nós, na maioria do tempo, não fazemos isso; fazemos exatamente o que você disse: fazemos o que é preciso sem nos darmos conta de nada. Depois, passou...

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