
Eu não me sento no trono de um apartamento com a boca escancarada cheia de dentes esperando a morte chegar. Seria esse o pior dos desperdícios.
Sabe por quê? Porque longe das cercas embandeiradas que separam quintais (e quantas cercas, quantos muros, quantos quintais e imensos pastos meu Deus!) no cume calmo do meu olho que vê assenta a sombra sonora de um disco voador.
... e o disco voador é imenso e desafiador, terrivelmente inquietante, de fazer a gente perder o sono. Ele plaina e pisca em silêncio absoluto ali, bem ali, além das cercas embandeiradas.
Há cercas e varais embandeirados de roupas perfumadas de sabão em pó. Cem vezes, cem vezes lavadas, cem vezes retorcidas e penduradas. Ainda que sacudam ao vendo sob um céu impressionante e que pareçam que dançar rir, tudo o que têm são os ombors umas das outras em amizades coloridas que não são livres. Debatem-se querendo voar e rirem porque é o que lhes resta.
Livre sou eu, não não estou no varal e posso pular cercas e estuprar cerrados e pastos que não me pertencem. Posso tocar nas luzes dos discos voadores, nas roupas. As vezes penso que posso tocar no céu.
Não sou leve nem danço mas não me sento no trono de um apartamento com a boca escancarada esperando nada por amor a Deus.
Sigo com os olhos nas cores que se desdobram pra mim, vindas de discos e árvores e vestidos úmidos e flores. Todas me fitam e desafiam igualmente mas só o disco me instiga para um outro plano.
Existe um outro plano que eu não conheço e que talvez seja muito estranho. Talvez não existam pastos nem varais.
Atiro-me sobre a imensidão da paisagem cheia de pedras e cercas, carrapichos e desníveis matreiros. Deixo para trás as pobres roupas de ombros sofridos.
Não quero dançar presa no varal nem morrer seca e verde no apartamento porque no cume calmo do meu olho que vê há sempre a sombra sonora de um disco voador.
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